terça-feira, 21 de agosto de 2012

nem alívio e nem ojeriza

Lavantei cambaleando como a bebum que encarnei naquela madrugada e senti na boca um gosto medonho que se aproximava de querosene. Resolvi que precisava me contemplar pra ter noção do estrago e então fui abrir a porta do armário, mas aquela simples tarefa se realizou com a dificuldade de quem tenta empurrar um elefante. Deparei-me com um rosto que nem de longe se assemelhava ao meu, aliás, não me recordava de ter aquela expressão patética de quem está sentindo pena de si e bem, talvez fosse culpa da ressaca, mas é sério que a minha memória apontava pra uma mulher que ostenta uma fisionomia muito mais firme. Só que a minha cara estava amassada demais, os olhos tinham remelas demais e foram se descolando com relutância, como se depilassem meus cílios. A cabeça doía e a própria vida me doía ainda mais do que a cabeça, de modo que tanto a cabeça como a vida me eram incômodas e pensei que "puta merda, eu só preciso de uma cerveja agora pra amenizar a desgraça".
Havia vários dias que eu acordava com umas idéias esdrúxulas e com a vontade áspera de encher a cara porque é assim que funciono: busco a saída fácil pros meus pequenos problemas e apelo aos recursos óbvios pra aliviar o vestígio daquele sentimento injustificado ao qual não consigo dar um nome, mas que é chato e faz com que me sinta ainda mais estúpida. Seguia me arrastando pelos cantos ao longo do dia à espera ou da cerveja ou da inspiração que não chegavam nunca, a primeira pela falta de grana e a segunda pela falta de ânimo. Mas sempre as esperando como o crédulo acredita na vinda de Jesus de Nazaré. E a tarde correu no marasmo e improdutividade de sempre, comigo obervando as paredes, sentindo dificuldade até pra escolher a música que queria ouvir e percebi que já nem queria ouvir música, pelo menos as minhas músicas, queria as músicas dos outros e até mesmo a vida dos outros, na verdade eu queria qualquer coisa que não fosse minha e não me fizesse lembrar de mim.
Aquele horário, 18:26h da tarde, era o pior porque nunca favorecera meu estado de espírito, afinal, essa parte do dia sempre chegava inevitavelmente carregada da angústia mórbida da transição, acentuada pela sensação de inutilidade que me persegue desde quando já nem lembro mais. "Sabe aquele momento em que você não consegue dizer se sente alívio ou ojeriza?", havia questionado e a pergunta martelava junto com a enxaqueca. Foi quando percebi que não era nem uma coisa nem outra, o sentimento inominável era saudade.
Saí pra comprar a birita pela qual clamei desde o momento em que acordei. Fui a galope até o disk cerveja e as adquiri com a veemência de um viciado em crack. Quando cheguei, abri a primeira e estava quente, reclamei. Abri a segunda, desceu um pouco melhor. Abri a terceira, estava OK. A quarta, normal. A quinta, sem graça. E no final das contas, fora como se eu estivesse tomando Kaiser. Nunca beber tivera sido tão pobre de vontade como naquela noite fria e... prometi que seria a última vez que tocaria no assunto, porque nenhum sacudo tem o direito de brochar uma mulher que quer ficar bêbada.

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