segunda-feira, 15 de novembro de 2010

álcool e digressões sobre velhos amigos

Dois amigos me avisaram que viriam aqui. Pensei um instante nos dois, refiz a imagem um pouco distraída que tenho de cada um. Sei há quantos anos se conhecem, como vivem. A gente sempre sabe dos amigos bem mais do que o resto do mundo, e como o resto do mundo já fui amiga de amigos que brigaram. É tão triste. É penoso e incômodo porque, então, temos que passar a considerá-los em separado e cada um fica sem uma parte da sua realidade. A realidade pra nós, eram esses amigos, não apenas no que os unia, mas também no que os separava quando estavam juntos. Preferimos que vivam mal, porém unidos, é mais cômodo pra nós.
No entanto, quanto mais avançamos na vida, mais nos convencemos de duas verdades que, tadavia, se contradizem. A primeira é de que, perante essa realidade, soam pálidas todas as ficções, porque são sonhos em que sentimos sentimentos que na vida não se sentem e se conjugam formas que na vida não se encontram. A segunda é de que, sendo desejo de toda alma o percorrer a vida por inteiro, ter experiência de todas as coisas, de todos os lugares, e sendo isso impossível, a vida só pode ser vivida por inteiro se for vivida subjetivamente, só negada pode ser vivida na sua totalidade. Essas duas verdades são irredutíveis uma à outra. Tem-se contudo que seguir uma, saudoso da que não segue, ou repudiar ambas, erguendo-se acima de si mesmo, numa espécie de nirvana próprio.
Como outras pessoas, esses dois já haviam se estranhado, mas aqui viriam eles, juntos. A campainha tocou. Acendi a luz e fui lhes abrir a porta e também, discretamente, o coração. "Quase não batemos, vimos as luzes apagadas. O que você tá fazendo aí no escuro?". Disse que nada, às vezes gosto de ficar no escuro. "Não disse que ela era uma morcegona?". Trouxe uma dose de cuba libre pra um e uma cerveja pro outro. Sou uma morcegona cordial.
Olhei-os enquanto bebia. Gostava de como estavam vestidos. Quanto a eles próprios, já os conhecia tanto, em seus encantos e em seus defeitos, que não me lembro de considerar se em conjunto eram bonitos ou não, e tenho uma leve surpresa sempre que ouço alguma opinião de gente estranha. Não consigo nem imaginar qual seria a impressão que eu teria se os visse agora pela primeira vez. Pensei todas essas bobagens em um segundo. Sentia-me grata por terem vindo me ver. Sentia-me quase comovida.
Feliz é quem não exige da vida mais do que ela espontaneamente lhe dá, guiando-se pelo instinto dos gatos, que buscam sol quando há sol, e quando não há sol procuram o calor, onde quer que esteja. Feliz quem abdica da sua personalidade pela imaginação e se deleita na contemplação de vidas alheias, vivendo, não todas as impressões, mas o espetáculos externo de todas as impressões alheias. Por fim, feliz é aquele que abdica de tudo e a quem, porque abdicou de tudo, nada pode ser tirado ou diminuído.
Mas nada me satisfaz, nada me consola. Não quero ter a alma e não quero abdicar dela. Desejo o que não desejo e abdico do que não tenho. Não posso nem ser nada, nem ser tudo: sou apenas a ponte de passagem entre o que tenho e o que não tenho. Que bosta.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

não pertencer a nada é a síntese da independência

Apenas uma vez fui verdadeiramente amada. Simpatias, tive-as outras várias vezes. Algumas dessas simpatias poderiam, com auxílio meu, pelo menos talvez, ter se convertido em amor ou afeto. No entanto, nunca tive uma ínfima paciência ou atenção espiritual para sequer desejar empregar esse esforço.
A princípio de observar isso em mim, julguei que havia nesse caso qualquer coisa próxima de timidez na minha alma. Depois eu descobri que não era nada disso. Não passava de um tédio de emoções, diferente do tédio da vida, uma impaciência de me ligar a qualquer sentimento contínuo, sobretudo porque eu haveria de aplicar um esforço prosseguido. A minha fraqueza de vontade começou sempre por ser uma fraqueza da vontade de ter vontade. Assim me sucedeu nos sentimentos como sucedeu em todo o resto da vida.
Mas daquela vez em que uma malícia da oportunidade me fez julgar que sentia uma pontinha a mais do que mera simpatia, fiquei, primeiramente, confusa. Fiquei, depois, com um sentimento difícil de definir, mas que se salientavam incomodamente as sensações de tédio, de humilhação e de fadiga.
De tédio, como se o destino me tivesse imposto uma tarefa com objetivos desconhecidos, como se um novo dever - o de uma horrorosa necessidade de reciprocidade - me tivesse sido imposto. De humilhação, por ter em mim um sentimento aparentemente tão pouco justificado pela sua causa. E fadiga, sobretudo fadiga, pelo esforço sobre-humano que eu teria que fazer para me matar pela reciprocidade me dada com a ironia de um privilégio e depois agradecer ao filho da puta do destino pelo sucesso da investida.
Até agora a mentira me fez suportar a vida, a insignificância e as palavras tornaram-me a vida possível, a vida onde à custa de palavras cheguei a ser Sarah Barquete, Esteves dos Reis, Sarah Reis, Baguete e Babete ou Boquete e Basquete. Só à custa disso pude aturar a vida e o horror da vida. Só por não a ver, pude encará-la. Só enquanto fui feita de pequenas misérias e palavras inúteis a pude suportar.
Custa muito construir uma vida fictícia, a ser Barquete e Esteves dos Reis, a criar um Deus ou uma mania. Custa a melhor parte do nosso ser. É certo que metade disso - pelo menos metade - é representado. Se me confessasse, eu diria: - Sou uma atriz, eu sou uma atriz de mim mesma: represento até quando sou sincera, até quando digo o que sinto é o outro eu, noutro tom de voz, que diz o que sinto.
Mais da metade, muito mais da metade dos meus sentimentos, são postiços. Todos estamos ligados por compromissos, aceitamos certas leis e vivemos de aparências. Existe entre nós e dentro de nós um acordo tácito. No fundo, sempre soube que o que me diziam era mentira, mas me sentia na obrigação de ajudar a mantê-la, respeitando esse compromisso vital.
Para podermos viver, lidamos apenas com uma parte convencional da vida, a outra não existe, se existisse, seríamos bichos. Essa vida é uma mentira e a outra é monstruosa e bestificada. Desabada a arquitetura aparente, ficamos simplesmente estúpidos. Isso que está aí por terra custou muito desespero, primeiro na inconsciência e obscuridade, através da inconsciência e obscuridade, e depois através de terrores e indescritíveis esforços. Custou a dor das dores, poder discernir dois ou três fatos essenciais na treva condensada.
Não se subordinar a nada - muito menos a um afeto - parece-me ser o decorrer natural da vida íntima dos que não param de pensar. Ter aquela independência longínqua que consiste na ausência de sentimentos, porque tudo isso é a cela e é também as algemas. Pertencer, eis a banalidade. Ser é estar livre.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

este absurdo que impele e esmaga

Eu sou uma desconhecida para mim mesma. Ia morrer sem ter tido um momento a sós comigo. E é com dor, com espanto e dor, que me reconheço. É com os olhos pasmos de dor que me vejo. Tudo mudou. A sofreguidão que todos os dias da vida nos empurra e leva, o sentimento de efemeridade e o horror da morte, essa coisa imponderável que inutilmente tento deter - sem nome e a que se chama tempo - que nos usa, a que não ouço os passos e que caminha inalterável. Tudo desapareceu de vez. Restou-me a lógica e a consciência. Mas a consciência aceito-a, admito-a, contanto que não me confunda. A consciência que todo mundo quiser, contanto que não me torne mesquinha e medíocre, ou não me iluda. Sou a única juiza da minha vida. O fim consiste não em dominar-me, mas em dominá-la.
Suprimida a consciência, suprimido também o tempo e o espaço, a sinceridade inexiste: o que está latejante é a paciência maliciosa, a mentira e a ferocidade. As coisas todas esperam a ocasião. Esperam e desesperam. A parte de dentro é que está viva e reclama de pé a sua vez. Mas notem: ninguém arrisca um gesto mais brusco. Por mais vinagre que lhes venha à boca estão habituados a engoli-lo. Nem se estivessem encapuzados se atreveriam a olhar a verdade. Pra dentro. Sempre pra dentro! E é assim de tal forma que nunca se construiu uma catedral com alicerces mais profundos.
A alguns só a paciência e o cálculo lhes permite viver. Às vezes têm fome - nunca dizem que sentem fome. Sabem logo quando entram numa casa as palavras que agradam a mãe rancorosa e a filha cheia de pretensões. Sabem sobre quem se há de falar bem durante aquela semana e mal na seguinte. Esperam como uma aranha de estômago vazio. Nunca pediram esmola. Melhor: conseguiram se dar ao respeito. E calculam, calculam, calculam, de barriga vazia, o tempo e as ações.
A inveja sustenta, mas o fel sustenta ainda mais. Com fel constrói-se uma vida porque ele proporciona uma certa solidez. Sem o fel seria impossível meter pra dentro todo o vinagre que vem à goela. De quando em quando até percebem o vasto campo de destroços de que deviam o olhar. Foi-lhes então inútil o fel? Sem ele já teriam morrido. Quando sentiram fome, quando deram dinheiro para o marido beber, quando disseram amenidades para o amigo sorrir, o que os sustentou foi o fel.
A mentira tem razão de ser, sem abjeção a sociedade os repele. Admite-se alguma abjeção, não completa e total, que repugna, apenas a necessária para servir de realce e moldura para os seus quadros. Acrescentem a isso o fato de se ter que viver com despreocupação, de sorrir com despreocupação, de mentir com despreocupação. A obrigação de se ter que viver com toda a despretensão do mundo mesmo com a miséria atrás de si.
O maior drama é o das consciências. O maior drama é arredar os trapos da vida para poder enxergá-la cara a cara. O maior drama é ficar só com o vácuo e de frente ao espanto. O maior drama é não encontrar razões para isto que vive de gritos e se sustenta de gritos - e ter que arcar com isto. Perceber a nulidade de todos os esforços e fazer todos os dias o mesmo esforço. Então todo o meu desespero, a minha dor, a minha renúncia, o meu calvário, se tornam inúteis diante do vinagre, da inveja e do fel.
Vidinha ignóbil...

sábado, 25 de setembro de 2010

a coitada que seria talvez sereia se tivesse aprendido a cantar

A maioria das pessoas que já passou por mim vive com espontaneidade uma vida fictícia e alheia. Uns gastam a vida na busca de qualquer coisa que nem querem, outros dedicam-se à busca do que querem porém não lhes é útil, outros, ainda, acabam se perdendo. E todos são abelhinhas atarefadas empregando seus esforços ao trabalho insano de reduzir a vida à insignificâncias, dando contorno às mentiras socialmente agradáveis.
Já eu, cheguei hoje, de repente, a uma sensação justa, num relâmpago íntimo, que não sou ninguém. Zero. Vazio. Nada. Vácuo. Absolutamente ninguém. Roubaram-me o poder ser antes mesmo que o mundo fosse. Se reencarnei, reencarnei sem mim. Sou os arredores da cidade que não existe, sou a figura de um romance que ainda não foi escrito, sou o poço sem muros. Eu, verdadeiramente eu, sou o centro que não há nisto.
Eu, verdadeiramente eu, não sou ninguém. Mas a maioria é. Fascina-me como são todos inabalavelmente felizes, como gozam a vida pra valer numa eterna good trip, como estão sempre famintos - ou com fome de celebridade ou com fome de aceitação, devorando as sobremesas da vida -, e quem os ouve, julga estar a escutar os mestres de Napoleão ou os instrutores de Camões.
Esses seres atribulados criam o mesmo bolor que um fungo nascido ao acaso em um lugar úmido. Têm o seu rei, as suas paixões e um cheirinho suspeito. Desaparecem e ressurgem sem motivo aparente num pedacinho do universo que lhes figura como o universo todo. Absorvem os mesmos sais, liberam qualquer substância purulenta que corresponda talvez a sentimentos, a vícios ou a discussões superiormente interessantes.
Seguem até o fim com palavras circunstanciais e premeditadas, sem atentar para o fardo que contém cada sílaba. Pesam toneladas de Newtons, têm a espessura de uma montanha e esmagam os ombros do meu pensamento. Forcejam para criar uma atmosfera que seja capaz de petrificar a realidade porque a lucidez é grotesca. Mas a outra vida que os subjuga está lá, esplêndida! E residem todos dentro do cenário cinematográfico que construíram e das regras que convencionaram. Está tudo catalogado.
Se há momentos em que a consciência de mundo me causa um desespero insuportável, desvio o olhar, tento entrar às pressas na vidinha inventada da galera bacana, finjo que esqueço e sorrio. E essa criatura esfarrapada que me tornei tem de aturar as ideias, os gestos afetados, as mesuras, até quando estou só meu sorriso se torna idiota como os deles. Mas sempre não posso! Ano atrás de ano não posso!
Então eu, verdadeiramente eu, que tenho tanta alegria quanto os santos imóveis nos seus nichos, começo a perceber que é o hábito que me tem feito suportar os pequenos ridículos. E para não morrer de espanto, para não ficar A Só e A Doida é que invento palavras, porque, afinal, o que me vale são elas para poder ter ao que me agarrar.
Nessas horas estranhas em que me ponho a escrever não só a minha vida material, mas a minha própria vida moral, se ilumina por outra perspectiva. Sim, nessas horas sei mais de mim do que nunca soube. Percebo o mundo irreal em que tento viver, onde estão todos a representar, regulados por hábitos e regras seculares, simplesmente para fingir que são indiferentes ao que os rodeia, que estão habituados ao que os rodeia, que sorriem ao que os rodeia.
Fecho os olhos. A chuva cai interminavelmente do céu com preguiça, na luz turva vejo sempre Juiz de Fora com as mesmas figuras de museu sentadas nas mesmas salas. Vejo vir os abraços, as ações, as cortesias maníacas dos confins da humanidade. Isto é merda. É vulgar e cotidiano. É uma aparência. No entanto, apenas essa ninharia é capaz de deitar as raízes mais profundas do medo esmagador da solidão.
Esse mundo de fórmulas a que todos se sujeitam e que eu tenho tanta dificuldade em obedecer. Esse mundo...

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

recomeço ou algum otimismo que espreita por detrás de qualquer tragédia

A vida em primeiro lugar é estúpida e depois incompreensível. Dotada de um absurdo ou beleza que não posso suportar. Se é mistério subtamente revelado, apavora-me. Se é nada, repugna-me. A vida é essa alguma-coisa que a minha imaginação não consegue alcançar. Para mim, um segundo ou um século têm valido a mesma coisa, talvez por ter feito apenas esperar, e "esperar" é aquele típico verbo que já abre prerrogativa ao aborrecimento.
Vive-se para a absorção da morte. Durante todos os dias esperamos num desespero sem gritos pelo fim, inflados de terror, como uma advertência instintiva. A morte é a dor extrema e emudecida. A vida é quase nada. Tudo que se conquistou à custa de desespero, lágrima e esforço converge para a cova e para sempre. PARA SEMPRE, OUVIRAM? Então por que nascer? Para ver isto e depois não ver mais isto? Para sonhar alto e depois não sonhar? Adeus sol, adeus amigos, adeus fodas, adeus álcool, adeus possibilidades.
Perco dias e noites na tentativa de me habituar à essa ideia e simplesmente não consigo. Tenho horror a ela, odeio-a. Joga por terra todos os meus cálculos. É o maior dos absurdos: ver para não ver, ouvir para não ouvir, viver para morrer... e tal como a cobra se apega à pele, o que mais me custa a largar é a vida, ainda que seja patética e ordinária. Não há quem possa com semelhante peso.
Na realidade, morrer é contrário à razão. Nunca acreditei que tivesse que morrer. Morrer é idiota. A realidade da morte é caricata e pega-me desprevenida. O sonho de não morrer... o pior é que esse sonho é o meu sonho e o sonho dos outros, ninguém o confessa senão a si. Nosso sonho é não morrer! Quando a gente se esquece, a vida já tem um passado e quando a vida já tem passado é que nos apegamos com mais saudades à ela.
Eu não vivi e ainda estou aqui, mas vou, só não sei pra onde. Vou porque quero ser mais do que sou, sem deixar de ser o que sou. Vou porque o fim lógico da vida não é morrer, é viver sempre, ascender sempre. Dando cabo à concepção de morte é que se abrange a vida, dá-se um novo impulso. Verá que colorido o mundo escorre e que frutos as árvores dão... e anseio por outros sabores e cores, outras vozes que não são as de sempre, outros ares, outros odores.
Quero a vida por inteiro. Quero a vida e a sua pobreza, e o seu sofrimento, e a sua mesquinhez, e a sua sujeira, e os seus canalhas, e as suas putas. Tudo, mas inerte não, inconsciente não. Quero recomeçar a viver a mesma vida inútil. Quero é recomeçar a viver a vida gota a gota.
Vou recomeçar a desgraça.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

ignorância + soberba = pt = péssimo exemplo = -brazil

Alguns se perguntam sobre como tornar o Brazil uma nação letrada. O governo petista se destaca quando o assunto é cultura e, sendo dotado de solícita erudição, deu um passo brilhante: arranjou para o Ministério da Cultura um secretário do Livro e Leitura, você sabia disso? Eu não. Mas tem, com a função de “acompanhar, avaliar e sugerir alternativas para as políticas do livro, da leitura e da biblioteca”. Segundo Ottaviano Carlo De Fiore “É fundamental que, nos meios de massa, políticos, estrelas, sindicalistas, professores, religiosos, jornalistas (através de depoimentos, conselhos, testemunhos)propaguem contínua e perenemente a necessidade, a importância e o prazer da leitura, assim como a ascensão social e o poder pessoal que o hábito de leitura confere às pessoas”.
Uma mentira do caralho, óbvio. Este maldito hábito de leitura constitui um dos maiores obstáculos à ascensão social no Brazil. Quer ver só? É inútil perguntar ao nosso Presidente da República a importância que os livros tiveram em sua carreira política, porque todo mundo sabe que não tiveram relevância nenhuma. Basta dialogar por 5 minutos com o Lula para ver que ele tem uma completa aversão por livros, principalmente por saber que a leitura não o ajudou a conquistar dinheiro, poder e a aura de respeitabilidade que lhe foi conferida. Pior é que se calhasse de ele ler os livros certos, correria o risco de não entender nada.
Nosso país tem uma centena de leis de incentivo à cultura. É incentivo de mais e cultura de menos. Eu aboliria todas elas, porque a maior receita para o sucesso no Brazil é o analfabetismo. As pessoas concordariam comigo se lessem, por exemplo, o plano do seqüestrador da filha do Sílvio Santos, 23 erros gramaticais em uma única página, embora o sujeito tivesse o 2° grau completo. Ou seja, ele ficou 11 anos na escola pra sequer conseguir aprender singular e plural. O Estado perdeu tempo e dinheiro, deveriam tê-lo ensinado algo de útil, como recauchutagem de pneus, e inseri-lo no mercado de trabalho aos 10 anos, para depois virar sindicalista e quem sabe, chegar ao cargo de Presidente da República.
Isso é o que o Lula e o PT transmitem ao país, um péssimo exemplo que ajudou a fazer do partido, não uma vergonha, mas uma espécie de fetiche nacional, onde o Palácio do Planalto é o harém de infinitas possibilidades de enriquecimento rápido para os ignorantes e ignorados pelo grande bananão.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

e a pedra é ainda mais pedra do que antes

O maior progresso feito pela raça humana foi aprender a raciocinar corretamente, ao contrário do que se apresenta de forma palpável, isso é muito mais subjetivo e metafísico, e não pode ser confundido com a mera capacidade inata de julgar. Dos tempos antigos à massa esmagadora da sociedade atual, o que predomina é o falso raciocínio.
Os povos e suas superstições quase mitológicas, os cultos religiosos usurpadores, os ambientalistas bocós sem conhecimento profundo ou mínimo conhecimento das ciências, as legislações falhas, o hábito ridículo de opinar até sobre Física Quântica quando não se sabe sequer calcular velocidade média, tudo isso são jazidas de provas sobre a temática da ignorância disfarçada em litros de opiniões da cultura do desperdício por só desperdiçar.
Os bufões das cortes medievais correspondem à juventude de agora. São os mesmos tipos de homens, semi-racionais, porém espirituosos, exagerados na simpatia e tolos, às vezes tão-só presentes para amenizar a patologia de um estado de espírito através de tagarelices, e para abafar com seu típico borburinho tapado o fardo da realidade. São os "bufões da cultura moderna", que julgamos mais suavemente ao não tomá-los inteiramente como responsáveis pela decadência do que se tornou o ato de pensar.
Hodiernamente, há uma dupla corrente de evolução: de um lado, um grupo de 10 mil pessoas com exigências cada vez mais elevadas e delicadas, e cada vez mais atentas para o "isso significa", e do outro lado, a imensa maioria, que a cada ano se torna mais incapaz de entender o significativo de qualque coisa, dotados de uma pobreza sensorial que se equipara à deformidade física e que, por isso, aprendeu a buscar em, por exemplo, Dilmas e Marinas, a solução aparente para suas questões por preguiça intelectual, ou seja, o repugnante em si, o feio, o baixamente sensual e atraente pela facilidade, pela obviedade de não requerer esforço mental, produzindo, assim, uma satisfação cada vez maior.
Se as pessoas considerassem que toda ação de um homem, não apenas um texto como esse, de alguma maneira vá ocasionar outras ações, decisões e pensamentos, que tudo o que ocorre se liga indissoluvelmente ao que vai ocorrer, seriam aptos a perceber a verdadeira imortalidade, que é a do movimento, como se todas as ações, decisões e pensamentos fossem dotados de alma e espírito, sem serem humanos.
Não sendo assim, posso assertar que aplicar lógica ao pensamento não é coisa tão natural como supõe Schopenhauer, mas algo aprendido tardiamente e que, até hoje, de forma evidente e triste, não predomina.

sábado, 28 de agosto de 2010

asco e vertigem

Não é nenhuma novidade colorida de que tenho elementos espirituais de boêmio, daqueles que deixam a vida ir como uma coisa que se escapa das mãos e o simples gesto de obtê-la de volta, dorme na ideia de fazê-lo. Mas não tive a compensação exterior do boêmio - o descuido fácil das emoções imediatas e abandonadas - porque nunca passei de uma boêmia isolada (o que é um absurdo) ou uma boêmia mística (o que é uma coisa impossível).
Tenho elementos espirituais de boêmio e por isso sinto náusea. Sinto náusea física decorrente dessa repulsa por vulgaridades, que é, aliás, a única repulsa que há em mim já faz algum tempo. E também, às vezes, talvez por capricho, tenho um desejo em aprofundar essa náusea provocando vômito só para aliviar a vontade de vomitar.
E é sempre a mesma sucessão de frases, de argumentos, de ordinarices e merdices. Esses que passam, sós ou juntos, não dizem, ou dizem milhões de coisas que eu não ouço ou finjo não ouvir, mas todas essas vozes me são absurdamente claras, com a transparência de uma taça de cristal.
E essa gente é melhor quando descrevo do que quando sinto. Ao descrever, esqueço e passa-me a náusea, vejo tudo fotograficamente, até mesmo a escada onde eles sobem aos tropeços, apalpando-se e atropelando-se na falsidade.
A intriga, a prosápia dita daquilo que não se fez, a sexualidade sem lavagem, as piadas como cócegas de macaco, o contentamento de cada um desses pobres bichos vestidos com a ignorância da inimportância do que são... tudo isto me produz a imagem de um animal monstruoso.
Não ouso dizer - nem mesmo através da escrita - o que tenho visto nestas dezenas de olhares casuais, nas direções involuntárias que tomam, nos seus atravessamentos sujos. Não ouso dizer porque, quando se provoca o vômito, é preciso provocar só um.

domingo, 15 de agosto de 2010

sobre a morte repentina no sentido figurado

Acordei morta. Não decifrei as razões e não entendi os porquês, muito embora não haja porquês e razões para a morte, mas o fundamental é que estava morta. Olhei-me no espelho e até achei que estava com um bom aspecto (se é que alguma vez tinha tido bom aspecto), mas não parecia nada com estar morta. Sempre fui um pouco feiosa, então ocorreu-me que talvez fosse apenas a sensação de estar um bocadinho mais fria por dentro traduzida como coisa morta por fora.
À segunda vista, tudo parecia escuro de sentimento. E aquela beleza que não existia revestia o entorno e separava as metades perfeitas da vida, tal qual uma borracha articulando vãos em diálogos. Lembranças transformadas em fundações para os muros serem edificados na memória. É triste como quando as coisas desfeitas são sentidas de fato, elas passam a ter a palidez de um sol à noite ou o respirar profundo do sono pesado.
Não sei se por ingenuidade ou por burrice, percebi tardiamente que palavras são apenas o veículo da ilusão, criadas pelas forças das circunstâncias. Uma ligeira inspeção na consciência foi o suficiente para virar o aparente ao contrário e verticalizar a linha do horizonte no sentido inverso .
Na diligência do penhasco, senti à volta o vôo circular da rotina que impregnou o ar do que sempre foi. E, de forma bastante aborrecida, observei a consternação que rodeava cada acontecimento e lamentava a apatia da vida cíclica, que pode não passar da eterna e vergonhosa insatisfação.
Hoje, as emoções ficam do lado de lá. Sei que qualquer sopro cretino é capaz de apagar as velas desse bolo estragado de tanto esperar. É só soprar.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

y a mucha honra maria la del barrio soy

As coisas estão estranhas. Sempre foram, a bem da verdade, ou talvez sejam demasiado simples para as entender (ou querer entender). Nem sequer sei o que sinto, quero sentir ou devo sentir. Neste momento vejo tudo em nevoeiro. Sinto tudo em nevoeiro também. Porque pior que se turvar a visão é tolhir o coração.

E porque estou farta de filmes, de coisas complicadas e de utopias, mesmo que não sejam filmes, utopias ou complicações. Até de mim mesma estou farta. Nem que seja por saber que se fosse outro eu já teria resolvido isto de outra maneira. Mas conheço-me o suficiente para dizer que sabia desde o primeiro instante que as coisas iam acabar assim. Acabar? Expressão errada. Iam chegar a este ponto.
Não há culpa. Mas também não há inocência. Intimamente, eu sempre tive uma certeza discreta que isto só poderia resultar em um esplendoroso fosso de merda, comigo atolada até as orelhas. E bem aqui do alto do meu egoísmo, egocentrismo, melancolia e dramatismo, eu pergunto: porra, por que é que tudo tem que ser tão complicado, confuso e vertiginoso?
Está decidido! Vou vender o argumento central da minha vida para uma novela do SBT.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

violência doméstica

Um amigo querido contou-me por estes dias que tem andado a se masturbar usando um calendário de uma campanha contra a violência doméstica. Disse-me que há modelos posando em "nu artístico". Chama-se "nu artístico" porque, segundo ele, depois de as ver, fica com uma estupenda ânsia criadora.
No entanto, parece-me contraproducente pôr mulheres daquelas para fazer tal campanha, quando são, precisamente, mulheres daquelas que estão na gênese da violência doméstica. Explico. Um sujeito chega em casa, olha para o trambolho que lá tem, compara com o bendito calendário e já lhe ocorre meter porrada na mulher. Daí surge a democratização da violência: primeiro espanca a esposa, depois espanca o... enfim.
Se querem minha opinião - e eu sei que sim -, o fato de um homem e uma mulher partilharem a mesma casa configura, imediatamente, um caso peculiar de violência doméstica. Por quê? Porque haverá alturas em que, embora estejam debaixo do mesmo teto, não estarão embrenhados maliciosamente no edredom, tampouco executando atividades relacionadas. O que significa que, muitas vezes, ambos ficarão animados pra nada. Isto, pra mim, também é violento.

terça-feira, 15 de junho de 2010

reminiscências que atravancam a vida

Há momentos que são especiais. Únicos. Que ficam gravados à fogo na memória de modo que nunca se esquece. Perfeitos dentro de toda a imperfeição em que a vida se apresenta. Há, também, pessoas que nos fazem sentir assim. Que nos proporcionam esses momentos e nos fazem sentir felizes.
Mas a felicidade é, assim como tudo na vida, efêmera. E esses momentos, por mais intrísecos que estejam, não voltam. Principalmente quando se começa a pôr tudo em cheque e a suscitar dúvidas sobre o que realmente se sente. E não vale a pena agarrarmo-nos a momentos perfeitos, aos fiapos de tempo. É melhor guardá-los com carinho na memória e ater-nos ao presente pra não abdicar da felicidade e do futuro por causa deles.
Outros momentos virão. Com outras pessoas, noutros ciclos, com tamanha felicidade e perfeição, se possível. O que não posso me permitir fazer, é deixar de viver a vida por estar algemada a um pretérito-perfeito. Não devo negar o que sinto hoje por querer sentir o que sentia outrora. Não serei feliz enquanto estiver presa a algo que me sufoca e me limita.
É preciso ter coragem para cortar amarras e seguir em frente. E não ter medo de agarrar novos momentos, novas felicidades, novas pessoas. Com as duas mãos. E deixá-las partir sem remorso, conforme exigir a circunstância.
Minha paciência já não é muita. E brincar de gato e rato já deu no saco...

terça-feira, 1 de junho de 2010

alguma esperança

A morte é a pior coisa do mundo. Não o digo por medo ou falsos moralismos. A morte é a única coisa do mundo que nos esvazia totalmente de esperança. E viver sem esperança perde todo o sentido. Olhamos para os familiares de doentes em estado vegetativo que ainda acreditam numa recuperação que os médicos garantem que nunca acontecerá, vemos pais que ainda esperam encontrar filhos desparecidos há anos. Mas apenas a morte coloca pontos-finais. Só a morte sentencia. Só ela nos deixa mais solitários que nunca, abalando os alicerces e as fundações de um mundo que dá com uma mão e tira com a outra. E nem as teorias de vida para além da morte nos acalmam e nos reconfortam perante o desespero e o vazio da perda. E perdemos a fé e a esperança.
Mas depois acabamos por recuperar. Lentamente. Vemos no mundo quotidiano pequenas razões que nos fazem acordar a cada dia e querer lutar. Por um significado para a nossa vida. Por alguém que nos é especial. Por um rumo que decidimos tomar. Pela felicidade utópica. E só faz sentido deixar de lutar por isso quando não houver mais esperança nenhuma no mundo e, sobretudo, em mim.
E mesmo que por vezes nos dê aquela vontade esmagadora de mandar tudo à merda e simplesmente seguir em frente, sabemos que não o faremos, simplesmente por ser algo que já está em nós, que é intrínseco. Ou por sermos masoquistas. Ou talvez por termos um ideal psicótico de felicidade que nós foi condicionado quase como um dever civil e que não abdicamos de perseguir. Ou por sermos burros mesmo.
E nem sempre se tem a inteligência superior para se tirar um tempo e respirar fundo, pensar decisões, agir com a cabeça o menos quente possível, porque quando a batata-quente está nas nossas mãos, tudo o que fazemos, dizemos ou até sentimos pode repercutir de maneiras irreparáveis. E não quero me arrepender de nada. Porque, bem lá no fundo, eu sei perfeitamente o que devo fazer, deixem-me só respirar um bocadinho pra que eu possa alimentar novamente a esperança de que há um mundo menos cretino e pessoas menos babacas ali fora...

sábado, 15 de maio de 2010

estou com bloqueio criativo bjs

Na força dos intentos nasce a razão e recuar é como desistir. A rocha da convicção é o único porto de abrigo que não afunda na podridão de uma afinação geral. Ouvidos seletivos são filtros de pura indiferença. Traduzem o som da nossa voz em espaço vazio e o olhar na distância do próximo acontecimento. Produzo qualquer opinião e espero o mínimo de atenção. Mas não. Nada. Vazio absoluto de interesse.
Então vivo virando folhas no livro da vida. E a cada página passada, tapo a anterior e não imagino qual será a seguinte. Fico por ler, no aguardo de outras imagens. Mas "aguardar" me é agora o tipo de verbo em que cago em cima. Esse desgaste contínuo promovido pela impotência diante das circunstâncias, destruiu os pilares da minha motivação.
Hoje até cheguei a sorrir de ansiedade perante algum capítulo a mais para a minha saga, quando comecei a esmorecer a esperança a cada dentada que dentava, a cada gole que goleava (não marquei nenhum gol, mas bebi uma garrafa inteira). Mas afinal, onde estão as surpresas? Tenho tudo sobre mim dito, redito, contradito, são todas as minhas coisas um montaréu roupas batidas, toneladas de quinquilharias apinhadas nas gavetas da vida. Será que não tenho mais nada a contar?
É, sobretudo, vazio. As folhas em branco da subida apontam para o cume do que não alcanço. O fim está do outro lado da intenção e alcança-lo só depende de mim. O suor que me escorre da imaginação não me deixa ver o caminho. Tropeço no desencanto e caio.

sábado, 17 de abril de 2010

inércia

Não é por mal ou desinteresse. Certamente não será também por falta de assunto. Por vezes é falta do lampejo inspirador. Ou antes a necessidade de me expressar de outras formas. Ou de não me expressar de maneira nenhuma.
Escrever é uma arte profunda que implica pôr em cada letra um pouco de nós, que nos desgasta e desgosta a cada frase. É muito mais que rascunhos, introspectiva-nos e nos faz inspirar naquilo que lemos, porque cada escrito é um manifesto. De amor, de paixão, de solidão, de desespero, de loucura, de método, de leveza ou de simples vontade.
Tudo o que leio e escrevo é único. Porque é meu. Como uma marca de nascença ou um traço de personalidade. E quando não se tem um rumo, quando parece ser difícil traçar objetivos, saltar muros e cumprir etapas, mais difícil se torna essa introspecção...

terça-feira, 30 de março de 2010

u.u

Tenho andado por aí à deriva, sem saber direito o que fazer. As estradas a minha volta são caminhos sinuosos que conduzem a um desconhecido que me provoca um pavor inexprimível. Está escuro, mais do que outrora, como se a puta da vida tivesse interposto uma superfície opaca entre meus olhos e o resto do mundo, permitindo que eu enxergue apenas os vultos e nunca tenha percepção da coisa como um todo.
E cada um desses caminhos parece um beco sem saída disforme e assombrado, onde tudo range e é arrepiado. E tenho medo de dar um passo a frente, porque tenho medo de dar outros passos em falso. E porque seria mais do que estúpido voltar atrás. E porque...
Minha cabeça está oca, quase tão vazia como a minha alma desde que... acho que desde sempre ou pelo menos desde onde a minha memória consegue alcançar. Não sei qual direção tomar, há muito perdi o sentido.
E o mundo, trocista, afasta-me, isola-me, parece querer pôr-me à prova sozinha. Talvez queira saber se tenho força para lidar com isto tudo sem ajuda. Não sei se realmente tenho. Gostaria sinceramente de ter. Muito embora eu tenha esta mania retardada de colocar o peso do mundo nos meus ombros e suportá-lo estoicamente.
Bom mesmo seria acordar agora em outro canto do mundo. Gritar em um campo deserto até me faltar o ar. Mergulhar num mar turbulento e impiedosamente frio. Fazer bungee jumping. Tudo para acordar desse torpor e me certificar de que ainda estou viva. Em meio a tantas incertezas, essa é uma coisa que sei que quero, sei que preciso me certificar de que ainda há vida por aqui e cada vez mais ganho consciência desse meu desejo inabalável.
Nada tem feito muito sentido, talvez tudo se resuma a mais um traço obscuro da minha personalidade com tendência para a melancolia. E aqui estou, na incompreensível encruzilhada de sentimentos que sempre fui, idiotamente repetindo o discurso de tempos atrás... já ficou chato.

quinta-feira, 18 de março de 2010

freio na bunda

Minha prima, no auge de sua curiosidade pubescente, perguntou-me enquanto eu tomava cerveja: "Por que é que algumas bichas gesticulam como meninas?". Uma bela questão para se colocar em pauta. Dei-lhe a lição didaticamente, de maneira que esclarecesse sua dúvida porém sem corromper o lacre da sua inocência.
A resposta é mais científica do que à primeira vista se pode supor. Ao contrário do que a sabedoria do bom povo sugere, um gay não age como uma mulher histérica só porque, sendo de mulheres que a maioria dos homens gosta, têm a esperança de chamar a atenção de um macho mais alcoolizado ou míope.
A verdade é que a principal diferença entre os dois gêneros sexuais é um pequeno freio na bunda que os homens têm e que falta às mulheres. A presença desse freio é um agente de um comportamento másculo e valente. Enquanto a falta do mesmo freio conduz a um comportamento efeminado. Por isso que os homens que trilham caminhos sexuais com outros homens passam a se comportar como fêmeas: pois têm o freio partido.
Ah!, disse ela em um tom conformado, "mas e os garotos amaricados que ainda são virgens?". Uma excelente follow up question, sim. Bom, continuei com minha sucinta explanação, nesse caso, tal como as garotas que, milagrosamente, conseguem manter intacta sua honra, o que sucede é que esse rapaz, provavelmente, foi vítima de um passeio de bicicleta mais violento que lhe lixou o freio.
Recebi um olhar radiante e grato de quem, pela pouca experiência de vida, estava prestes a me endeusar pelo resto da vida. Retribuí com uma olhadela caída e esbocei um sorriso disforme, que não representava absolutamente nada senão o meu grau alcoólico.
Crianças modernas e suas questões repletas de metafísica... eu deveria era escrever um livro de educação sexual, caralho.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

corpo meu ou cabeça minha?

O tempo e a saudade, e alguma preguiça também na verdade, encaminharam-me para o meu novo bar favorito. O bairro, não o bar, porque cresci nele. Esperançada por mais uma cervejada épica, passei à porta do paraíso da cerva em garrafa e álcool à vontade, com a expectativa da saudade dos anos em que fui alguém melhor.
Cheguei ao estabelecimento e fechei a porta com o estrondo habitual de quem foge da chuva. Sacudi a alma, pendurei-a. Sacudi o corpo, levei-o ainda mais para o interior. Lá dentro o tom castanho-fumo escondia os bêbados do boteco lazarento: o meu outro eu já deixava cair a dignidade no chão. Tinha sido a primeira a chegar e era, pela linha temporal, a mais bêbada.
Aproximei a sede e a ansiedade do balcão e pedi o habitual. Ao meu lado, um pequeno ser, de tez muita pálida, assim quase albino, mordia com a avidez de um balofo, um paiol. A pele ostentava ainda, sardas e outras manchas. Os demais, dirigiam-se-lhe por qualquer frase definida por "mais uma dose!".
O suor me escorria pelas têmporas de pouca experiência. Já não sei se é do corpo, se é da cabeça. Mas este desconforto, que ninguém o mereça! A sensação de mal estar em todo o lado, ao mesmo tempo perdida e achada. Numa névoa de vontade, que me levava para longe com a verdade e a certeza de que o que não espera é a idade.
Estava cansada da distância imposta pela circunstância. Queria ter mais tempo para todos e não conseguia. Meio ano havia passado desde a grande cagada sentimental. E meio ano se passou desde esse dia para cá, bastantes pessoas foram lidas. Perdão, bastantes não, porque nunca bastam. Muitos. Muitos também não, porque me sabem que são sempre poucos. Talvez alguns. Isso mesmo. Neste ano que passou li alguns homens.
Agucei a minha curiosidade crônica e regulei a audição para ao máximo.
Ainda o sol não sabia que era dia e já a necessidade se levantava na direção de uma feira que era terça. O pensamento positivo de que "o que tem que ser tem muita força", ajudou a abraçar a saída noturna com o peso da embriaguez pelas costas.

Tentei também contribuir para a descida de alguns lugares neste ranking miserável em que teimamos permanecer. A minha vida, na sua muito modesta dimensão, é um veículo de combate a estas realidades impostas pela mídia brasileira. Se a influência de ler qualquer bosta for passada a uma pessoa que seja, o resultado é sempre positivo e a vitória é um virar de página. (inspirada no matheus e seus momentos de consolo literário)
Mas não chega. Sinto que não chega. Aconselhar, incentivar e sugerir não são garantias de leitura. Penso na escuridão em que vivem os que não descobrem este prazer. Na verdade, são vítimas do desconhecido e não sabem o que estão a perder simplesmente porque nunca experimentaram.
E se fosse possível formar as pessoas em prazer de leitura?!

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

carnaval

Satisfações diárias não são vontades contrárias. São necessidades que todos temos e poucos alcançam, como a pequena vitória da motivação ao final de um dia. Esta janelinha de oportunidade é muito difícil de conjugar, de maneira que tudo está bem até o momento em que deixa de estar: quem diria?! Que fulano andava triste, nem parecia. Ninguém esperava uma coisa destas. Que pena, tão novo…
Não sabemos dos outros os silêncios, as angústias, as vontades, as boas e más disposições. Ilusões? Estratégias? Capas de sorriso a esconderem frustrações constantes e desgastantes. Rebentamos por vezes pela fragilidade do apoio necessário porém desencontrado, o pilar que não sustenta, a ajuda que não chega.
Estou farta e estou cansada. E tenho dores na cara que não quero ter. Preciso recarregar as baterias para enfrentar um 2010 extremamente extremo! Necessito respirar outros ares e sentir outras paisagens. Por aqui os ambientes estão com o sufoco do peso e também precisam de um recesso.
Não sei como, nem sequer se consigo realmente me desligar daqui. Vou sentir falta e saudades da dose diária de comodidade, mas este bilhete de férias que tirei para a próxima semana dá-me, por um lado, o descanso da rotina que sempre foi.
No fim vai valer à pena.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

da singeleza e brevidade

Lembrem-se de uma coisa. Sempre. É simples, nada de complicado. É até bastante simples. E é o seguinte... acompanhem-me.
Está calor. Muito calor. Está, portanto, insuportavelmente quente. A vontade de sair é inferior à média brasileira e não consegui dormir.
Há comida de sobra na geladeira, dispensa e nos outros lugares onde se guarda comida. A Sarah, esta que vos escreve, não sabe cozinhar e não tem a menor vontade de fazê-lo. Restou-me pensar e fumar.
Ideia: a idade.
A idade vai comendo a vida. Vai tolhendo o futuro e nós a observarmos. Adormece-se com um dia a menos, acorda-se com um dia a mais. O calendário muda discretamente os corpos. Vai empurrando as costas para a queda ser pequena. Os velhos sabem de cor o chão, como quem tem certeza de que está quase a chegar lá.
Desde que perdi minha madrinha, o meu respeito por quem mora no terceiro andar da idade aumentou exponencialmente. Perde-se para ganhar. E assim foi.
Com a idade, nunca escolhem o meio, escolhem sempre o fim do banco e deixam-se estar. Respiram como podem. Os olhos não procuram mais nada, já viram tudo. Vão guardando o passado em rugas.
Os velhos não vivem, deixam-se viver. Os filhos ingratos já têm a vida deles e não os querem mais. Ninguém quer as doenças cheias da idade. Eles têm de ir viajar ou fazer compras para o jantar solitário, esquecidos num semi anonimato enfastiante.
Os novos choram com o corpo todo, gritam, esperneiam e fazem caras de quem sofre. Os velhos choram só com os olhos, que o resto não se vê. Assim o fazem ao fim de cada telefonema carregado de obrigação ao invés de amor e gratidão, "o pai tá bem? Então tá, um beijo".
As mãos da idade são agora veias cansadas de mostrar o sangue para todo o mundo. As pernas vão perdendo caminho. Os braços deixam de abraçar. O coração começa a falhar, mesmo para quem amou pouco. Vai esquecendo de bater. Até que, em uma noite, desaprende. Desliga os olhos e atira o corpo para o fim.
Lembrem-se de uma coisa. Sempre. É simples, nada de complicado. Emociona-me a brevidade e singeleza da vida.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

brasil é um país de palhaço

O palhaço compra empresas por milhões, vende-as por uma penca de bananas, fica com o troco e diz que não há nada. O palhaço compra ações não cotadas, em um ano consegue que rendam 137,5 por cento e acha que está tudo bem.
O palhaço escuta as conversas dos outros e diz que está sendo escutado. O palhaço é um mentiroso. O palhaço quer sempre maiorias, maiorias absolutas. O palhaço é absoluto e absoluto a ponto de colocar notícias nos jornais, nos tornando ainda mais descrentes.
O palhaço é igual a outro palhaço. E a outro. E são iguais entre si. O palhaço mete medo, porque está por todos os lados. E ataca sempre que pode. E ataca sempre que o mandam. Sempre às escondidas. Seja a dar pontapés nas costas de agricultores, seja a desviar as atenções para os ruídos de fundo, seja a instaurar processos, seja a arquivar processos.
Porque o palhaço é só ruído de fundo. Pagam-lhe para ser isso com verbas públicas. E ele se vende por isso, vende-se por qualquer preço. O palhaço é covarde, um covarde impiedoso. Depois ou diz que não fez nada, ou pede desculpa. O palhaço não tem escrúpulos.
O palhaço está em comissões que tiram conclusões, depois diz que não concluiu, escondendo-se atrás dos outros vociferando insultos. O palhaço porta-se como um débil mental no Congresso, como um boçal nos conselhos de administração e é grosseiro nas entrevistas.
O palhaço faz maus orçamentos e depois os retifica. Diz que não dá dinheiro para desvarios mas depois dá porque o mandaram dar. E o palhaço cumpre, é obediente, de uma sujeição quase medieval.
O palhaço rouba dinheiro público. E quando se vê que roubou, quer que se diga que não roubou, quer que se finja que não se viu nada. Depois diz que quem viu o insulta porque viu o que não devia ver.
O palhaço é ruído de fundo que há de acabar como acaba todo o mal. Mas antes, ainda vai viabilizar orçamentos e centros comerciais em cima de qualquer coisa, ocupar bancos e construir comboios que ninguém quer.
O palhaço vai fazer muito barulho com seus pandeiros carnavalescos, saracoteando-se em palhaçadas por comissões parlamentares, gabinetes e presidências, roubando e violando porque acha que pode fazer. Porque acha que é regimental e normal agredir, violar e roubar.
E com isso o palhaço tem crescido e ocupado espaço e vai perdendo cada vez mais a vergonha, porque não lhe tem acontecido nada desde que conseguiu uma passagem administrativa e se tornou político.
Este é o país do palhaço. Nós é que estamos sobrando. E continuaremos sobrando enquanto o deixarmos aqui estar. A escolha é simples: ou nós, ou o palhaço.