segunda-feira, 23 de novembro de 2009

sobre pessoas mentalmente limitadinhas

Essa noite começou como tantas outras de tantos outros tempos, uma mão no teclado e outra no copo de cuba libre, esta apenas abandonada para, periodicamente, levar o cigarro à boca. Serra é que vá para a casa do caralho com a lei anti-fumo, meu cigarro, sim, é que é das coisas mais bonitas que me fazem agarrar a vida com as duas mãos (quer dizer, com uma, já que a outra está sempre preocupada a me embriagar).
Em meio ao álcool, ao recadinho sem vergonha de um débil mental, à frustração de ter uma mentalidade incompreendida pelos ignorantes de plantão, nutri a esperança ridícula de que se fosse descortinada a aversão à sinceridade real pelas pessoas pouco dotadas de inteligência, raciocínio e cultura.
Percebi que há a má influência literária dos últimos anos. Publica-se de tudo, - Dan Brown, Paulo Coelho, Stephenie Meyer, até poemas moderninhos, caralho -, agora lição de honestidade que é bom, nada. Editores, seus bostas, vamos por mãos à obra.
Contrariamente ao que seria de esperar, porém, ao cabo de alguns minutos, um ser humano dotado de um cérebro funcional, acaba por se aborrecer. Fiz a mim própria a pergunta de costume: o que é que me incomoda? Ignorância? Ignorância disfarçada de status? Ignorância intelectual? Ignorância cultural? Senti que me incomodavam profundamente todos os tipos de obscurantismo.
A burrice alheia se reflete na vida de uma pessoa lúcida e crítica como um por de sol infeliz ou como um disparo que falha por um triz ou como perder sem nem sequer mexer um músculo. É como uma luta inglória contra mil gigantes, como uma alma destinada ao fracasso, é como saber que as coisas importantes são tudo menos o que fazemos. É como cada minuto ser uma vida e cada sonho uma epopéia e cada aspiração uma causa perdida. Ou, só pra contrariar os super felizes sem inteligência e senso crítico, é como a vida ser um lugar fodido.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

sonho mau

Era um quarto que se podia devorar em 5 passos. Cinzento de vontade e bafiento de desânimo. Estava muito calor e o chão rangia a castanho esquecido. Sentei no colchão de molas tristes, que me arranhavam a dignidade, e pensei na saudade. Sobretudo, na saudade que tinha de não sentir saudade, pois era essa a primeira carta que caía do meu castelo de sonhos instáveis.
Olhei para a rota de desleixo e chorei. Chorei pela vontade. Senti toda a solidão do mundo de dentro daquele quarto e olhei a paisagem da janela. Era de dia e estava sol, mas os meus olhos só viam escuridão. As paredes aproximavam-se no adensar do desalento e percebi que tinha que sair. Algumas roupas gastas mais tarde, cheirava a cidade no seu interior e caminhava na razão do pensamento.
Segui os caminhos da infância e aproximei todo o resto ao olhar. A cidade corria ao ritmo dos afoitos e o calor encolhia vaidades. Observei todos e cada um, e pensei com inveja onde iriam com tanta certeza, com tanta vontade de lá chegar.
No canto mais fresco da marquise, um monte de merda que não identifiquei escondia um corpo. Dormia de sujidade e esquecimento. Aproximei-me e toquei no que parecia ser um ombro debaixo de roupa velha. Reagindo ao toque, o corpo virou-se e fixou o horror de espanto: era a minha cara que ali estava, debaixo de muito cabelo e imundície!

Acordei transpirando e esticando o fino lençol que já não se via de tanto esticar. Sentei-me na cama de molas ainda tristes e olhei ao redor. Havia voltado sem nunca ter saído.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

uma nota de decepção

Mais um castelo que se desmoronou. Irremediavelmente? Por pouco tempo? Não sei. E sinto-me magoada. Não, não me sinto magoada. O que há em mim é sobretudo desilusão, por pensar que conhecia os outros e julgar que nunca alguém seria capaz de chegar a este ponto crítico de falta de caráter e hombridade.
Estou profundamente decepcionada. Com a falta de coragem das pessoas, coragem pra serem sinceras umas com as outras, mas principalmente pela falta de coragem para entenderem e lutarem pelo o que elas sentem e acreditam.
Falta-lhes dignidade. Sobra-lhes egoísmo. A mim falta olho crítico e me sobra compaixão, e são essas coisas que, combinadas entre si e em regra geral, nos fazem sentir assim da forma como estou agora... as malditas expectativas que se elevam sem uma justificativa racional.
E custa ver que ninguém vale a merda que caga, que as palavras não passam de dissimulações. Custa saber que acreditamos no que havíamos jurado não acreditar mais, por termos nos deixado levar pelo que prometemos resistir. E o pior de tudo é saber que estamos essencialmente desiludidos conosco pela nossa cegueira.
Não sei como reagir a isso. A única coisa que tenho como certa, é tudo o que sinto. E isso, sinceramente, não ajuda mesmo em nada...

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

más escolhas

Uma das referências da minha vida, para o bem e mais ainda para o mal, morou lá pelas bandas do Rio de Janeiro em 1800 e qualquer coisa, era alcoólatra e morreu tuberculoso aos 20 anos. Tomei-o para mim e fiz dessa relação intangível no espaço e no tempo, algo que se aproxima de uma relação entre pai & filha.
Filiação que, evidentemente, foi equívoca desde o princípio, quer pelo fato de o meu temperamento já manifestar uma forte objeção às coisas extremamente felizes, como também pelo fato de eu ter crescido em um ambiente familiar conturbado, barulhento, instável e fodido.
Minha realidade me é ácida, as visões que povoam a minha mente parecem compensar, pelo menos em grande parte, a ausência de realizações. Pedaços de céu sonhados aqui ao lado: na minha cama desarrumada, com os lençóis revirados e alimentados pelo excesso de álcool e drogas, temperados com o cheiro deprimente e enfastiante de sono no ar.
Invoco aspirações felizes e criações ideais a meu bel-prazer, desfrutando sob todas as formas, buscando qualquer ventura que me acalente. A maioria delas sonhadas em um estado lastimável de entorpecimento.
Estou me esvaindo em devaneios. Vivo uma vidinha patética esgotada em ilusões. Não poderia eu, nova e intacta, ter escolhido como pior referencial, de vida e conduta, um sujeitinho mais decadente do que o tal Álvarez...

domingo, 1 de novembro de 2009

a garota mais triste que já segurou um martíni

Àquela hora só conseguia manter apenas um olho aberto e mesmo esse só me fornecia imagens desfocadas. Entre a neblina da embriaguez, parecia ver tudo num tom castanho-claro-brilhante. Algumas indagações mentais mais tarde, percebi que tinha a cabeça sobre o balcão. Estava de volta ao bar. Decidida a combater a inércia, abri o outro olho.
Agora via tudo em tom claro-torrado-com-oscilações, olhava através da taça de martíni. Numa tristeza irônica e sorridente, pensei que não houvesse mais meios de descer na escala da humilhação - ainda bem que estava encostada ao balcão! - e chamei a mim todos os sentidos necessários à operação de levantar a cabeça: equilíbrio, orientação, força e força de vontade. Cinco minutos depois a ação revestia-se de sucesso. Embora um bocado vacilante, a cabeça se encontrava na verticalidade possível.
Sobre o balcão estavam oito copos cuidadosamente alinhados. Em comum tinham apenas o fato de estarem vazios. O nono, que ainda continha líquido, estava próximo de mim por dois motivos: primeiro, era o único ao alcance da mão sem ter que esticar o braço; segundo, eu já havia olhado através dele e por isso conhecia seu interior como ninguém. Tomei um gole pequeno porque aquilo tinha que durar.
Vou ao mesmo bar todos os dias, sento-me no mesmo lugar todos os dias, à mesma hora de todos os dias eu me encosto ao balcão. Todos os dias narro um fato diferente, todos os dias trago um fardo diferente, todos os dias lamento por uma desgraça diferente. Que merda de rotina.
Cada carta da insegurança social aumenta-me as pulsações do desespero e a sede! Não fosse a minha escassa liquidez ($) a quantidade líquida aumentaria. Por aqui devem pensar que sou sovina, mas se eles soubessem que não tenho muitos putos nos bolsos da calça imunda, talvez tivessem a bondade superior de me oferecerem mais doses.
Entretida com meus pensamentos tão pouco sóbrios, nem reparei nos acontecimentos seguintes. - Mais uma tacinha, por favor.