quinta-feira, 6 de setembro de 2007

uma janela aberta para a minha vida fantástica

De perto ninguém é normal? Sei lá, tenho minhas dúvidas. É o tipo de clichê que vivem me dizendo a respeito da minha conduta socialmente duvidosa. Já ouvi todos os tipos de axiomas de alento moral, desde "nem tudo na vida é um mar de rosas" à "pinto que acompanha pato, morre afogado", a sabedoria popular com fins consoladores. Sobre minha normalidade não há muito o que discutir, é só transferir o foco de atenção para o meu dia-a-dia conturbado, fora de uma mesa de bar entregue às fartas libações alcoólicas e as subseqüentes aventuras ácidas, e colocar uma lente de aumento bem aqui no Clã dos Barquete para constatar que de perto ninguém é tão anormal quanto a minha família.
A história de como eu me tornei o quê eu sou, esse ser asqueroso que odeio, é muito mais complexa do que aparenta, há agravantes demais, há narcóticos demais, há frustrações demais, há muita coisa a mais envolvida demais na história lamentável da minha vida. Eu poderia voltar um pouco no tempo, comentando sobre minha avó que se casou com um fazendeiro rico, moreno, alto, bonito e sensual que, ao invés de ter sido a solução de todos os seus problemas, tornou-se a fonte de todos os problemas. Ou sobre o mistério contido por detrás do meu nascimento e toda essa babosereira de cartomante, previsões apocalípticas, cortina de continhas, tarô e almofadas bordadas.
Uma sucessão de fatos que levou à concretização da profecia. É toda essa história de que você constrói o próprio destino, as escolhas que você faz durante a sua vida, as atitudes mal-avaliadas, contudo tomadas, as repulsas, os sorrisos, o tédio, as vozes. Tudo uma seqüência difusa de escolhas que culmina tristemente na morte. Você escolhe, trabalha, chora, ama, briga, almeja, adere à princípios, à alguma religião, segue a moda, se escraviza, escraviza a alma, e quer mais dinheiro, se desdobra por motivos diversos a vida toda para, simplesmente, morrer e virar restos, cinzas e nada.
Minha mãe nunca teve vocação para mãe, muito embora ela não seja de fato tão desgostosa enquanto mãe, enfim, serei concisa: para ser minha mãe ela é realmente péssima, como mãe dos outros, um primor. Talvez ela devesse ter sido mãe de outro alguém ou até mesmo de uma outra garota mais simpática, menos rude, menos amarga, mais meiga. Ela poderia ter escolhido e como todo o mundo, minha mãe tinha um destino alternativo, poderia ter feito tudo diferente e ter poupado uma vida, evitado uma vida triste e vazia.
A verdade é que tudo o que eu tenho feito não me tem trazido vantagem estratégica alguma, felicidade alguma, não tenho tirado proveito de nada, tenho me sentido cada vez mais infeliz e Deus meu!, ninguém faz idéia do tanto que tudo isso me magoa, de como eu me sinto realmente. Meu espírito anda pra lá de fatigado, cansado do mundo e sedento de outro mundo. Estou magoada comigo mesma por não ter tido ímpetos, por não ousar, por ter aceitado continuamente enxovalhos muitas vezes calada, por me ter permitido permitir o que eu não queria. Os meus silêncios têm sido terríveis e as minhas convulsões interiores têm sido lastimáveis.
De fato, eu ri sarcasticamente para a vida, se ela me prega peças e impõe obstáculos que eu não tenho vontade alguma de transpô-los, continuo rindo sarcasticamente e ela me responde mais sarcástica e sadicamente com uma centena de pedregulhos arremessados contra minha cabeça e, ainda assim, eu me mantenho estática, nutrindo uma esperança ridícula de que algum milagre divino me livre dos destroços de mim mesma.

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